Wednesday, January 10, 2007
Alto de S. Bento: antes das origens de Évora
O Alto de S. Bento é um cabeço granítico, adjacente à cidade de Évora, que funciona como um excelente miradouro sobre a cidade Património Mundial.
Conhecido como povoado pré-histórico desde, pelo menos, o séc. XIX (foi visitado por E. Cartaillac), o Alto de S. Bento foi recentemente objecto de novas prospecções que permitiram afinar melhor a cronologia dessa ocupação e levantar novas questões, extremamente interessantes, no contexto da neolitização do Alentejo Central.
De facto, além das evidências de ocupação no Calcolítico (genericamente, o III milénio antes de Cristo), o sítio foi ocupado numa época que, em princípio, corresponde à própria transição Mesolítico-Neolítico, isto é, a fase em que as últimas sociedades de caçadores-recolectores deram lugar às primeiras sociedades agrícolas e pastoris e que, no nosso território, ocorreu algures entre os finais do VI milénio antes de Cristo e os inícios do V.
A atestar esta fase mais arcaica, recolheu-se um conjunto de artefactos de sílex (lamelas e micrólitos geométricos) e raros fragmentos de cerâmica decorada, sugerindo algum paralelismo com o sítio, escavado no Verão de 2006, da Barroca 1, nos arredores de Mora, assim como com o sítio do Barrocalinho 17, nas proximidades de S. Pedro do Corval.
De uma forma geral, pode afirmar-se que, nesta fase, o Alto de S. Bento foi um dos povoados dos construtores de menires e recintos megalíticos (ou cromeleques).
Por outro lado, a superfície do batólito, junto aos moinhos onde, actualmente, funciona um Centro Interpretativo para a Geologia e a Flora regionais, apresenta alguns elementos cuja cronologia pré-histórica, embora discutível, parece bastante sugestiva. Trata-se, sobretudo de um conjunto de sulcos alongados, de secção em V, que se assemelham aos que acompanham, com frequência, os polidores de machados, como se pode observar, nos arredores de Évora, junto à base do marco geodésico, no cabeço do Godel, perto do cruzamento da Valeira. Trta-se igualmente de um local com vestígios de povoamento pré-histórico.
Este tipo de marcas, cuja funcionalidade é controversa, é recorrente, noutras áreas europeias, em associação com dolmens e menires e foi também observado em rochas das proximidades do sítio com gravuras rupestres dos Mocissos, no Alqueva.
No Alto de S. bento, os sulcos ocorrem associados a manchas de picotados, temática igualmente representada no complexo rupestre do Alqueva.
Para além daquele conjunto de traços, junto à entrada do moinho mais meridional do Alto de S. Bento, observa-se igualmente, no lado oposto do mesmo moinho, uma linha sinuosa, picotada, que pode, eventualmente, corresponder a gravuras rupestres, parcialmente ocultas pela estrutura molinária.
Junto ao outro moinho restaurado, em frente à porta, são também visíveis três covinhas, pouco profundas, mas que correspondem à métrica habitual neste tipo de gravuras; as covinhas são, como se sabe, um dos temas mais recorrentes, em termos planetários, da arte rupestre pré-histórica.
Por último, refiram-se as duas "pias" escavadas em frente ao primeiro moinho. Trata-se de estruturas negativas cilíndricas, de formas extremamente regulares, cuja funcionalidade nos escapa e cuja atribuição a épocas antigas e a objectivos rituais se pode, provisoriamente, admitir. Sugerem, efectivamente, as pias que caracterizam muitos dos santuários rupestres pré-romanos, associados, em geral, ao mundo cultural indo-europeu ou, sobretudo, as que, na Galiza, parecem estruturar complexos painéis decorados com círculos, espirais e labirintos, como acontece na famosa Laxe das Rodas, em Muros.
Seja como for, o Alto de S. Bento é, sem dúvida, um dos grandes povoados neolíticos da região, cujo estudo, em vários níveis, enriqueceria certamente o património arqueológico eborense.
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